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Cenipa aponta que modelo de avião que caiu já perdeu controle por gelo em voo

Pilotos de um avião modelo ATR 72, o mesmo que caiu em Vinhedo (SP) na sexta-feira, perderam o controle do voo após enfrentarem uma formação de gelo e declararam emergência no ar durante um voo entre Maceió e Salvador em 2013.

As informações constam em um relatório do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos) de 4 de outubro de 2021, obtido pela coluna do UOL. O documento foi produzido após o órgão realizar uma extensa investigação do que ocorreu com a aeronave durante a viagem.

O Cenipa classificou o caso como um “incidente grave” que teve “múltiplos fatores contribuintes”. Na investigação, os técnicos apontaram para três determinantes, que levaram à perda de controle:

Condições meteorológicas adversas;
Decisões equivocadas da tripulação;
Potenciais falhas e fatores de manutenção e projeto.

A condição de formação de gelo em rota também foi encontrada pelo ATR 72 que caiu em Vinhedo. Esta tem sido uma hipótese levantada por especialistas como possível contribuinte para a queda do avião. O acidente, porém, continua sendo investigado e não há qualquer conclusão até o momento.

Rota no Nordeste
O voo em questão ocorreu no dia 26 de julho de 2013. A companhia aérea que o operou foi a extinta Trip, que fundiu operações com a Azul um ano antes. Assim como na aeronave da Voepass, o avião levava quatro tripulantes e 58 passageiros. No caso, porém, a aeronave pousou em segurança e ninguém se feriu.

O céu naquela noite estava nublado a encoberto, com nuvens e cristais de gelo. O voo seguiu sem problemas até a altitude de cruzeiro (16.000 pés), voando a uma velocidade de 202 nós (354 km/h).

O voo decolou às 18h10 e tudo ia bem até 18h37, quando a tripulação identificou “formações meteorológicas” e discutiu a necessidade de desvios na rota.

Na conversa entre piloto e copiloto, eles demonstram dúvidas sobre os dados apontados no radar meteorológico. Sete minutos depois, eles percebem uma formação de gelo. A partir daí, tem início uma sequência de 13 minutos de problemas, que levaram à emergência na aeronave. Veja a sequência:

18h48 – Comandante observa a queda de velocidade da aeronave (estava em torno de 185 nós) devido à formação de gelo. A tripulação, então, solicita desvios à esquerda para fugir de mau tempo.
18h49 – Comandante entrega o voo ao copiloto.
18h53 – Copiloto aciona as luzes de “atar cintos” e solicita desvio de rota à esquerda.
18h54 – Gravador de voz da cabine registra som semelhante ao de voo em uma região com chuva. Comandante retorna à cabine e reassume o controle.
18h59 – Gravador registra uma forte vibração no avião. A potência dos motores é reduzida para 20% de torque, e a velocidade indicada cai para 158 nós e começa a perder sustentação. Piloto automático é desligado.
19h00 – Início de vibração na cabine, aumentando progressivamente de intensidade. Motores reduzem a potência de 72% para 20%, e a velocidade chega a 148 nós.

Nesse momento, ativa-se de forma automática a campainha de “atar cintos” e soa um alarme triplo na cabine –entre eles de estol (perda de sustentação). Copiloto declara mayday (emergência) e solicita à torre a descida da aeronave.
19h01 – Acionamento dos manetes das hélices para a posição bandeira (espécie de ponto morto). Vibração para, hélices são ajustadas de volta a 82% de potência, e tripulação retoma o controle da aeronave e segue até o pouso.

Nesse pequeno intervalo de tempo entre o estol [perda de sustentação] e a recuperação, a aeronave chegou a atingir um ângulo de ataque (entre a asa do avião e o fluxo de ar) de 52°, e um ângulo lateral de 58º à esquerda. Houve uma queda de 5 mil pés de altitude.

Segundo o relatório, houve momentos em que ele foi de um lado para o outro. O problema ocorreu quando a aeronave sobrevoava o município de Esplanada (BA).

“A aeronave se aproximou perigosamente do seu limite crítico, o que poderia ter resultado em uma perda total de sustentação e consequente queda livre”, afirma um piloto, que pediu para não ser identificado. “No meu entender, foi exatamente a situação que ocorreu [com o avião da Voepass].

Erros e falhas
Segundo as leituras do gravador de dados, não houve mau funcionamento ou falha do motor em voo.

O Cenipa, em sua avaliação, apontou que a decisão do comandante de reduzir a potência do motor em resposta à vibração da aeronave “exacerbou a perda de velocidade aerodinâmica, levando a um estol.”

“A tripulação reduziu a potência do motor em vez de aplicar potência máxima, como recomendado para condições de gelo severo.”
– Relatório Cenipa

Ainda para o Cenipa, houve gerenciamento inadequado de tarefas e comunicação confusa na cabine, o que pode ter atrasado a tomada de decisão e a aplicação de procedimentos corretos.

A tripulação alegou que interpretou erroneamente a vibração como um problema com a hélice, em vez de um estol induzido por gelo, já que uma outra tripulação havia relatado problema semelhante em janeiro.

Sistema potencialmente falho
A investigação ainda aponta que o sistema APM (monitoramento de desempenho da aeronave), projetado para alertar a tripulação sobre condições perigosas de gelo, estava inoperante durante o voo.

A tripulação relatou não ter observado qualquer indicação de que o APM se encontrava em “off”. O fato de ele estar desativado sem o conhecimento dos pilotos levantou preocupação do Cenipa sobre a confiabilidade do sistema.

Antes desse voo, o livro técnico da aeronave tinha dois relatos de falha no APM, nos dias 16 e 21 daquele mês. “Em ambos os casos, foram adotadas as ações e o problema foi considerado solucionado”, diz.

A ausência de um red bug (indicador de velocidade mínima para voo em condições de gelo) no velocímetro do comandante também pode ter prejudicado a consciência situacional, diz o Cenipa.

Fabricante tomou medidas
O relatório do Cenipa aponta que a fabricante realizou uma visita técnica à companhia aérea para esclarecer eventuais questões referentes a procedimentos de voo em condições de gelo.

O treinamento periódico dos pilotos foi reformulado após o caso, dando-se maior ênfase ao gerenciamento do voo em condições de formação de gelo na aeronave.

A ATR também identificou áreas de melhoria em termos de redação, formatação e apresentação, para facilitar a tomada de decisão da tripulação e a recuperação de informações essenciais durante o voo.
Sobre as falhas no indicativo do APM, a ATR disse que diz que fez extensa investigação, e que a única condição identificada seria a falha do próprio botão de alerta.

Fonte: UOL

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